quarta-feira, 5 de outubro de 2005

Literatura: Manuel Bandeira!

Esta matéria de Josélia Aguiar nos brinda com textos inéditos da maravilhosa e vasta obra do poeta Manuel Bandeira. Quando pensamos que nada mais há que se contar, eis que somos surpreendidos por textos de sua autoria em prosa. Será maravilhoso digerir tal obra!! Leitura mais que obrigatória, é leitura prazerosa!!
Abraços!
Juca
------------
Bandeira todo prosa
Faceta menos conhecida do poeta se revela em novas reedições e em textos inéditos em livro
POR JOSÉLIA AGUIAR
---------------
O pai o criou desde menino para arquiteto, mas um dia a saúde se foi e ele virou poeta -"um poeta menor", como diz Manuel Bandeira (1896-1968) no seu "Testamento", uma das pequenas obras-primas que denunciam sua grandeza. Na vida, que durou muito mais do que a tuberculose permitia prever, ele escreveria não apenas os versos pelos quais é conhecido. Sua produção intelectual foi profícua e eclética. Dedicou-se a crônicas, ensaios e críticas de literatura, música e artes plásticas publicadas em jornais e revistas do Rio de Janeiro, São Paulo e Recife entre as décadas de 20 e 50.

Essa vasta obra em prosa não continuará ignorada por muito tempo. A Cosac & Naif adquiriu da Nova Fronteira os direitos de republicar mais de uma dezena de livros com escritos dessa natureza -- os versos vão continuar com a editora carioca. A notícia é ainda mais alvissareira pela promessa de que, na nova leva, virão ao menos dois volumes com crônicas até então inéditas em livro.
------------
A reedição seguirá seqüência cronológica, explica o editor Augusto Massi. As crônicas chegam em primeiro lugar, sob a forma de cinco volumes, já no começo de 2006: Crônicas da província do Brasil (1937), Flauta de papel (1957), Andorinha, Andorinha (1966), Os reis vagabundos (1966) e Colóquio unilateralmente sentimental (1968).
"Bandeira prosador não decepciona em nada aqueles que já aprenderam a admirar o poeta. Ler Manuel Bandeira é sempre uma experiência intelectual marcante", diz Massi.
------------
De fato, encontrar o Bandeira poeta nas crônicas é a primeira das graças de ler a sua prosa. Não é senão o autor de "Profundamente" quem aparece em Flauta de papel escrevendo sobre os parentes mortos: "O livro mais precioso de minha biblioteca é um velho caderninho de folhas pautadas e capa vermelha, comprado na Livraria Francesa, rua do Crespo, 9, Recife, e em cuja página de rosto se lê 'Livro de assentamento de despesas. Francelina R. de Souza Bandeira'. Era o nome da minha mãe." Mais adiante, diz: "Sinto meu avô materno nos meus cabelos, sinto-o em certos meus movimentos de cordura. (...) Minha mãe transmitiu-me traços de meu avô que, no entanto, não estavam nela. Que grande mistério que é a vida".

As crônicas oferecem a aventura lírica de reconstituir parte da biografia do poeta, principalmente os capítulos mais emblemáticos de sua vida - o da tuberculose - nos trechos em que o tom confessional prevalece: "A história da minha adolescência é a história de minha doença. (...) A moléstia não me chegou sorrateiramente, como costuma fazer, com emagrecimento, febrinha, um pouco de tosse, não; caiu sobre mim de supetão e com toda a violência, como uma machadada de Brucutu", escreve, em Andorinha, Andorinha.

O poeta em seu apartamento no Rio de Janeiro, anos 40

A leitura das crônicas de Manuel Bandeira faz o leitor reconhecer uma das principais características de toda uma geração literária. Escrever crônicas, para os modernistas, foi decisivo na defesa da oralidade que pregavam. O gênero introduziu "certo prosaísmo na poesia", afirma Massi. É assim que a prosa cristaliza o estilo poético de Bandeira: "Alguns temas tratados nas crônicas muitas vezes migravam para a poesia, operando como vasos comunicantes". Para rastrear essa reciprocidade, o editor sugere ler Libertinagem (1930), o quarto livro de poemas, e Crônicas da província do Brasil, escritas anos antes, e comparar as duas obras.

A segunda leva da Cosac & Naif vai trazer de volta os ensaios em Apresentação da poesia brasileira (1944), Literatura hispano-americana (1949) e De poetas e poesia (1954). É a vez de o leitor saber o que Bandeira pensava sobre literatura. As novas edições, organizadas pelo crítico e pesquisador Júlio Castañon, terão introduções escritas especialmente para a ocasião, notas e fotos.

Antes da prosa chegar, um livro de poemas muito especial marca a estréia de Manuel Bandeira na Cosac & Naif: 50 Poemas escolhidos pelo autor, que sai este mês, é exatamente o que o título diz. Em 1955, o próprio poeta selecionou os versos que ele considerava mais importantes, a pedido de José Simeão Leal, que organizava a coleção "Os Cadernos de Cultura", editada pelo Serviço de Documentação do MEC. O volume foi o de número 77, numa coleção que reunia diferentes áreas do conhecimento, e jamais havia sido reeditado.

O livro começa iconoclasta, com "Os sapos", o poema com que Bandeira causou estardalhaço na Semana de Arte Moderna de 1922 e marcou o seu rompimento com o passado de influência parnasiana. Estão lá, na seleção feita por ele, os "clássicos" com os quais é reconhecido, como "Pneumotórax" ("Diga trinta e três") e "Vou-me embora pra Pasárgada" ("Lá sou amigo do rei"). Depois, é a vez de surgir o Bandeira existencial, melancólico, de "A morte absoluta" ("Morrer mais completamente ainda, sem deixar sequer esse nome") e "Noturno do morro encantado" ("Já morri quando o que eu fui morria").

A musicalidade dos versos sempre foi uma marca de Bandeira, e é assim que o leitor pode descobrir como seu timbre de voz confere outro sentido - agora, com a audição - àquilo que escreve. Acompanhado do livro, um CD registra o poeta lendo 25 poemas, em uma coletânea de gravações dispersas em discos dos anos 40 e 50 que foi reunida pessoalmente por Augusto Massi.

O poeta volta ao nosso tempo com outra relíquia. Em 1967, o embaixador Lauro Moreira e a mulher, a escritora Marly de Oliveira, receberam sua visita no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro. Após o jantar, o poeta quis gravar poemas seus. Moreira recolheu da estante um livro de Bandeira e o entregou ao poeta para uma inesquecível sessão de declamações.

Por mais de três décadas, o som foi abafado pela incapacidade técnica de torná-lo audível. Dois anos atrás, numa emissora marroquina, ocorreu ao diplomata tentar escutar outra vez o velho rolo de fita. "De repente, numa emoção solitária, começo a ouvir aquela voz anasalada e tão familiar", recorda. O CD Manuel Bandeira - o poeta em Botafogo tem como contraponto peças para piano de Camargo Guarnieri (1907-1993).

0 Recado(s). Após o sinal, deixe o seu!:

Assinar Feed dos Comentários

Postar um comentário

Obrigado por deixar seu comentário sobre os serviços da "Lavanderia Virtual". Procurarei respondê-lo o mais rápido possível. Volte sempre! :-)

Abraços,
Juca (o gerente)



 

  ©Template Lavanderia Virtual, Customizado por Juca, baseado em Blogger Addicted.____Icons by DryIcons._____Ping Technorati____